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O ChatGPT vai matar a profundidade do debate?
Jul, 2023
Ao sermos menos complexos, como a Inteligência Digital se alimentará de nossas perguntas?
Por Marcio Jorge, CEO da ZAHG Marketing Digital
Reza a lenda que, em um passeio pelas ruas de Quito, o escritor uruguaio Eduardo Galeano viu escrito em um muro: “quando tínhamos todas as respostas, mudaram as perguntas”. Foi por meio do mestre Galeano que esse adágio se tornou amplamente difundido entre salas de reuniões e perfis sociais de auto-ajuda.
Tal frase carrega em si, simultaneamente, uma belíssima aura filosófica e uma crueza óbvia. Com isso, ela nos mostra a imensa importância de elaborarmos perguntas corretas e mutáveis para caminharmos adiante no debate público.
É de conhecimento geral que algoritmos e redes neurais, que são importantes partes das IAs como o ChatGPT, desenvolvem cada vez mais profundidade e refinamento em suas respostas por meio de perguntas feitas a elas por nós, humanos.
Veja também: Antes do ChatGPT, ZAHG debateu Inteligência Artificial
E é exatamente aí que reside um ponto de dúvida que eu gostaria de expor a você, caro leitor: nós estamos sabendo fazer as melhores perguntas?
Se formos analisar sobre o ponto de vista do cientista político francês Christopher Clavé, as notícias não são nada boas. Ele afirma em seus estudos que estamos ficando menos inteligentes como sociedade.
A razão desse emburrecimento seria um “empobrecimento da linguagem”, resultante de uma diminuição de conhecimento lexical (repertório de vocábulos) e das sutilezas linguísticas que permitem elaborar e formular pensamentos mais complexos.
Um dos efeitos mais percebidos é o desaparecimento gradual dos tempos verbais. Isso gera um pensamento enraizado no presente, limitado ao momento, incapaz de projeções no tempo e, consequentemente, de abstrações mais subjetivas.
Outra visão pessimista sobre nosso futuro pensante vem de outro francês, o neurocientista Michel Desmurget. Em seu livro A Fábrica de Cretinos Digitais, afirma que o consumo de telas digitais já está afetando o QI de toda uma geração. E lança mão de dados técnicos para comprovar sua tese.
As pesquisas de Desmurget apresentam resultados bastante contundentes ao apontar que alicerces fundamentais da nossa inteligência – como linguagem, foco, memória e cultura – sofrem influências negativas das telas digitais. Quedas significativas no desempenho acadêmico são apontadas como evidência do fenômeno.
Desmurget faz o contraponto também, afirmando que as telas podem ser benéficas desde que os conteúdos consumidos sejam mais pedagógicos e menos recreativamente empobrecidos.
Por fim, não podemos deixar de fora da discussão o acelerado processo global de polarização ideológica, que nos coloca em um comportamento cada vez mais auto defensivo, que gera diálogos apenas com grupos de pessoas que pensam como nós.
Como resultado, esse fenômeno está definitivamente matando o debate, um dos grandes instrumentos do aprofundamento crítico e gerador do saber.
O fim da retórica pressupõe o fim das perguntas com profundidade e complexidade.
E ao sermos menos complexos, como a Inteligência Digital se alimentará de nossas perguntas? É evidente que suas respostas serão proporcionalmente rasas e isso limita seu desenvolvimento argumentativo.
Será que por uma ironia do destino, o ChatGPT e a Inteligência Artificial de forma geral padecerão por conta de nossa falta de Inteligência Natural?
Tenho certeza que não.
Nós vamos virar esse jogo, armados com educação, senso crítico, abertura de debates e, finalmente, nossas boas e velhas perguntas que nos trouxeram até aqui.
E mostraremos às máquinas, que quando elas tiverem todas as respostas, nós mudaremos as perguntas.